
Ingresso de indígenas nas universidades da Amazônia cresce, mas taxa de conclusão ainda é desafio
Daniela Souza, Daniel Nardin, Idayane Ferreira e Vitória Farias, em reportagem colaborativa entre InfoAmazônia, Assobiar e programa Rede Cidadã InfoAmazônia. Imagens de Jennifer Bandeira (Amazônia Vox) e Genilson Guajajara. Colaboração: Jullie Pereira, Carolina Dantas (edição) e Alice Martins (revisão textual versão Amazônia Vox).
14 de outubro - 2024
Quando chegou a hora de decidir qual profissão seguir, Rubens Xipaya se lembrou da própria mãe. Ainda jovem, ela precisou sair da comunidade em que vivia, em Altamira, no Pará, e ir até Belém para buscar atendimento de saúde para o pai, que corria o risco de perder a visão por causa de uma catarata. Hoje, Rubens está estudando medicina na Universidade Federal do Pará (UFPA) com o objetivo de atuar nos territórios indígenas.
Rubens Xipaya é estudante de medicina na Universidade Federal do Pará. Foto: Jennifer Bandeira/Amazônia Vox
“Não é fácil saber que minha mãe precisou se desligar da sua comunidade para buscar tratamento na capital porque em Altamira e na sua comunidade não tinha. Eu preciso ajudar a mudar isso e que outras mães e famílias não tenham o mesmo destino longe de seu território”, afirma.
Ainda adolescente e crescendo na cidade, Rubens imaginava outro caminho, bem diferente. Como a maioria dos garotos de sua idade, sonhava em ser jogador de futebol. Chegou a atuar na base do Paysandu, tradicional clube paraense. Frequentes lesões não permitiram avançar na carreira, mas a convivência com a irmã em Belém influenciou outro rumo: ela já cursava medicina e incentivava que ele retomasse os estudos.
“Costumava ver minha irmã estudando e trabalhando. Ela conversava, incentivava. Comecei a pensar o que faria da minha vida e no início imaginei fisioterapia, que fazia com frequência. Mas não pensava em montar uma clínica, atender na cidade. Quando passei pelo sistema de ações afirmativas, para medicina, só reforçou isso. Foi por onde entrei na faculdade. Então tenho que devolver. É um dever meu, um compromisso com a minha origem”, afirma Rubens.
Nos momentos de dificuldade, seja financeira para se manter na cidade ou pela carga pesada de estudos que todo estudante de medicina enfrenta, Rubens rememora o motivo de estar ali. “Não é fácil saber que minha mãe teve desligamento da sua comunidade para buscar tratamento na capital porque aqui em Altamira e na sua comunidade não tinha. Eu preciso ajudar a mudar isso e que outras mães e famílias não tenham o mesmo destino longe de seu território”, argumenta Rubens.
Desafios - Histórias como a de Rubens têm se repetido cada vez mais na Amazônia Legal: os indígenas estão tendo maior acesso às universidades públicas. Em 2022, pouco mais de 6 mil indígenas estavam matriculados em uma das 26 instituições de Ensino Superior públicas da região. Esse número é três vezes maior do que em 2013, primeiro ano de aplicação da Lei Federal de Cotas (12.711/2012).
Entre 2012 e 2022, o total de estudantes indígenas matriculados cresceu 245% na Amazônia Legal, passando de 1.784 para 6.157. Além disso, o número de ingressantes que iniciaram a formação nesse período aumentou 82,5% (de 635 para 1.159). Esses dados fazem parte de um levantamento da Amazônia Vox, do Portal Assobiar e da InfoAmazonia, com base nos censos educacionais e demográficos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A análise, que abrange os censos de 2012 a 2022, permitiu comparar a evolução anual da presença indígena nos grupos de ingressantes, matriculados e concluintes.
Com falta de apoio para permanência, menos de 10% concluem o curso
Em 10 anos, de 2013 a 2022, 53.757 indígenas se matricularam em cursos de graduação na Amazônia Legal, mas apenas 5.327 concluíram os estudos, o que representa uma taxa de conclusão inferior a 10%. Abimael Munduruku, que ingressou na Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) em 2013, hoje é professor universitário e explica que existe uma série de dificuldades específicas aos indígenas no ambiente acadêmico.
“A minha graduação foi bastante desafiadora, porque eu não conseguia simplesmente me ver como apenas um estudante. Muitos estudantes indígenas enfrentam grandes dificuldades porque nos tornamos lideranças e, ao mesmo tempo, uma esperança para a nossa comunidade. Isso você não consegue deixar de lado", afirma.
Além disso, há a barreira da língua. Segundo Marília Leite, docente da formação acadêmica indígena da Ufopa, a universidade pode ser um ambiente em que os idiomas e os conhecimentos ancestrais indígenas não são valorizados. Isso gera um tipo particular de preconceito contra aqueles que não dominam completamente a língua portuguesa.
"Sofre quem fala uma língua indígena e sofre quem não fala, porque o problema não é a língua em si, mas a identidade dessas pessoas [...]. Os que falam português na universidade enfrentam preconceito, sendo considerados ‘falsos indígenas’. Já os falantes de uma língua originária também sofrem, porque, quando falam com sotaque, as pessoas dizem: 'ele não sabe falar português direito'”, conta Marília.
Em rede, indígenas encontram suporte para resistir e permanecer nas universidades
Na UFPA, a maior universidade do Norte do Brasil em número de estudantes, são adotadas políticas de ingresso para estudantes indígenas e quilombolas, visando reduzir parte desses problemas, tanto para aumentar o ingresso dessas populações quanto para mantê-las matriculadas. Entre as políticas, está o Processo Seletivo Especial para Indígenas e Quilombolas (PSE I/Q), que reserva quatro vagas adicionais em todos os cursos de graduação presencial, sendo duas para indígenas e duas para quilombolas.
Jhosy Marworno, do povo Galibi-Marworno, do Amapá, é a atual presidente da APYEUFPA (Foto: Arquivo pessoal)
Ao longo de mais de duas décadas, a UFPA registrou o ingresso de 687 estudantes especificamente nesta modalidade. Em 2024, veio o número mais alto, com 110 indígenas aprovados. Já em relação aos concluintes, a universidade observa aumento nos números a partir de 2021, quando 16 indígenas terminaram os estudos. O marco mais alto anterior havia sido em 2017, com dez. Em 2023, um novo recorde, com 20 estudantes indígenas concluindo a graduação.
Na modalidade de ingresso por processo seletivo especial, a UFPA contabiliza atualmente 525 estudantes indígenas matriculados e frequentando os cursos. Já a Associação dos Povos Indígenas Estudantes na Universidade Federal do Pará (Apyeufpa) considera os estudantes que também ingressaram por outros processos e de pós-graduação, chegando a 775 estudantes de 40 povos, vindos de diversos Estados da Amazônia brasileira. Pelo monitoramento realizado, segundo a Apyeufpa, nos últimos dois anos, apenas dois estudantes desistiram dos cursos.
O acompanhamento junto aos universitários é feito de forma permanente pela diretoria da associação, que se reúne em uma sala própria no campus central da UFPA, conquistada em 2011. O espaço que serve de referência e facilita os encontros é uma das reivindicações de Rubens, assim como de outros alunos,para o campus de Altamira, que tem forte presença de estudantes indígenas e quilombolas.
A atual presidente da Apyeufpa, Jhosy Marworno, do povo Galibi-Marworno, deixou o território, localizado no município de Oiapoque, no Amapá, para estudar em Belém, em 2020. Dois anos depois, assumiu a presidência bianual da Associação. “Faço parte da militância indígena na minha base e trouxe isso para a universidade também, pelas necessidades que temos. É uma responsabilidade muito grande e significativa, pois sei da importância desse coletivo. A Apyeufpa é hoje uma referência para quem vem dos territórios e sabe agora quem procurar, para não só cursar e frequentar a universidade, mas viver e militar pela nossa presença nesses espaços”, afirma.
A estudante assumiu a gestão da entidade quando a Apyeufpa já somava mais de uma década de atuação. Um dos pontos fundamentais para isso foi o trabalho realizado em diálogo com outros movimentos indígenas em diferentes áreas de atuação, como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Federação dos Povos Indígenas do Estado do Pará (Fepipa) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). “Hoje a reitoria nos consulta para a elaboração de editais de bolsas, na formatação de programações acadêmicas, para promover mais a troca do nosso conhecimento ancestral com o científico. Se falam que é algo para os povos, têm que ser construído com os povos, pois só nós sabemos nossas especificidades”, relata Jhosy.
O trabalho agora, no entanto, é duplo: manter as conquistas e somar outras frentes, numa “vigilância permanente dos nossos direitos”, como resume a estudante e lideranças. “Tudo que temos hoje foi exigido, foi luta de lideranças e precisamos manter e aumentar. Se não formos vigilantes, vão nos apagando e deixando de lado. É por isso que resistimos tanto”, avalia Jhosy.
A própria experiência de Jhosy, apoiada pela associação, é colocada a serviço de outros estudantes. Tendo como primeira língua a Kheuól Galibi-Marworno, de seu território, compreende a dificuldade que muitos têm com a própria comunicação e aprendizado. Também enfrentou a distância da comunidade e os obstáculos financeiros para se manter na cidade.
“Muito estudante passa por isso e como rede, buscamos acolher e apoiar. No território a alimentação por exemplo é de graça, a natureza dá. Aqui, tem custo de vida alto e sem suporte financeiro da família, por exemplo. Por isso, a luta por maior acesso às bolsas é fundamental. Mas aí vem outro problema, que é a dificuldade em conseguir todos os documentos e a burocracia necessária, que então apoiamos os estudantes em diversas frentes”, explica.
“Nós ainda enfrentamos o racismo todos os dias. Somente no primeiro semestre deste ano tivemos quatro casos dentro da universidade. Então, é uma questão que tem que ser reconhecida para ser combatida. A nossa vestimenta, pintura, adereços, tudo isso é alvo, tem pessoas que ficam perguntando se é indígena 'de verdade'. Só vão respeitar se nos verem, se nos conhecerem e entenderem que estamos sim cursando faculdade, que a universidade também é território tradicional, seja indígena, quilombola, extrativistas ou ribeirinho. Tem que ser diverso de verdade”, aponta Jhosy.
“Na nossa cultura, tudo é coletivo. Nada é individual”, afirma estudante
Prestes a se formar em medicina e já na fase do internato (nome dado ao estágio curricular obrigatório do curso), Lorena Curuaia, da comunidade Iawá, é uma das referências para muitos estudantes indígenas na universidade ou para aqueles que estão pensando em iniciar a vida acadêmica. Quando iniciou o curso de medicina, ainda em 2019, era uma das poucas indígenas na universidade.
Após passar por desafios e enfrentar preconceitos, Lorena Curuaia está bem perto de se formar em Medicina pela UFPA.
Foto: Jennifer Bandeira
Lorena foi uma das primeiras a ingressar em medicina em Altamira pelo Processo Seletivo Especial para Indígenas e Quilombolas (PSE I/Q). Também é a primeira universitária de sua comunidade, a Iawá, cuja base do território fica às margens do rio Xingu, na chamada Volta Grande do Xingu. “Recebi muita ajuda e passei a ajudar outros também. Fui a primeira e senti aquele baque. Nós, povos indígenas, temos uma cultura em que tudo é coletivo, nada é individual. Por isso ter uma rede é tão fundamental para a permanência na faculdade”, avalia Lorena.
Essa mesma determinação é recorrente na resposta de Juniano Kaxuyana, que ainda está no começo do curso de medicina, no segundo semestre de um total de doze. Antes, cursava enfermagem e durante a pandemia, o ensino passou a ser remoto, o que impactou ainda mais nos obstáculos de adaptação que já enfrentava. Quando veio a oportunidade de trocar de curso, com o programa de mobilidade que é oferecido pela UFPA, não teve dúvidas e partiu para medicina. Seu objetivo é também se formar e retornar para realizar atendimento em territórios indígenas. Ao longo do curso, porém, não faltam obstáculos a superar. “Temos estudantes que falam várias línguas e o português, às vezes, não é sua primeira. Isso é um desafio sim, mas não impede de estarmos cursando e se aprimorando no curso, já que no âmbito da faculdade somos desafiados debater com os colegas, como ocorre nas nossas aldeias e comunidades”, destaca.
Rubens Xipaya faz parte da Apyeufpa e afirma que a associação oferece um acolhimento psicológico fundamental para quem enfrenta, diariamente, um preconceito muitas vezes velado: “há muita coisa que não é dita. Pelo olhar e pelas escolhas na formação de grupos, a gente percebe. Eu sou muito comunicativo e acabo rompendo isso. Mas há muitos outros com um perfil diferente, que vão se calando, se machucando, até abandonarem o curso em silêncio. A associação acolhe o indígena, faz com que ele se sinta confortável entre os seus e exponha as dificuldades. Aí, buscamos soluções, lutamos por direitos, como tutorias e mentorias”.
Juniano Kaxuyana, estudante de medicina na UFPA de Altamira
Mesmo após a faculdade, a luta para se manter nos espaços continua. Já usando o uniforme do hospital, após anos de sala de aula, Lorena Curuaia explica que é importante aprender a lidar com essas diversas situações ao longo do curso para conseguir enfrentá-las novamente ao chegar ao mercado de trabalho.
“Tive que ouvir questionamentos com frequência, como ‘olha, tem uma indígena no curso de medicina’. Sim! Agora, tem uma indígena atendendo no hospital. É um processo muito difícil confrontar isso o tempo todo e no mercado isso pode continuar ocorrendo. Então, até essa vivência temos a faculdade para aprender a lidar e permanecer, para ocupar mesmo todos os espaços, que é um direito mesmo nosso, por fazermos parte da sociedade”.
Indígena, estudante e mãe de dois
Vanusa Viana Guajajara, é mãe de Levi, 11, e Priscila, 7. Ela precisa conciliar a vida acadêmica com os cuidados dos filhos, do marido e as responsabilidades na aldeia Piçarra Preta, na TI Rio Pindaré, em Bom Jardim, no Maranhão, localizada a 277 km de São Luís.
Como estudante do 7º período do curso de Biologia na Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), campus do município de Zé Doca, a 59 km da aldeia, Vanusa conta que nunca conseguiu se adaptar completamente à universidade. Ela chega a mencionar um episódio em que foi cortada de uma foto de grupo postada por uma colega.
Vanusa Guajajara, da Terra Indígena Rio Pindaré, em Bom Jardim, no Maranhão Foto: Genilson Guajajara/InfoAmazonia
“Parecia que estávamos em lados opostos. [A universidade] era um ambiente de intensos conflitos, especialmente durante o período político do governo Bolsonaro, onde havia pessoas que apoiavam o partido e não simpatizavam com certas causas. Em um seminário, por exemplo, após minha apresentação, tiramos uma foto em grupo e uma aluna postou essa foto, mas me cortou dela, deixando apenas uma parte do meu vestido visível. Isso me afetou muito. Pode parecer bobagem, mas me senti muito mal”, disse.
Quando era criança, Vanusa morava dentro do território, na mata, com a mãe, que a incentivava a estudar. “Fiquei na aldeia até a alfabetização. Depois, minha mãe trabalhava na roça com meu padrasto, e eu ia junto. Mas ela sempre se preocupava e dizia para ele que eu precisava voltar para a aldeia para estudar”.
“Quando fui prestar vestibular, optei pela UEMA porque era a opção mais acessível na época (...). O curso de Biologia chamou minha atenção por abordar temas relacionados às nossas lutas e à sustentabilidade, áreas importantes para nossa realidade cotidiana. Quando surgiu o edital da UEMA, procurei informações, conversei com a gestão da escola indígena e descobri que havia vagas em Zé Doca”, conta.
Segundo ela, os dois primeiros períodos foram mais tranquilos devido ao formato online, mas os seguintes trouxeram uma complicada rotina de transporte e a insegurança no município de Zé Doca, uma região com conflitos sociais frequentes.
“Ingressei na universidade já sendo mãe, o que traz sua própria rotina e desafios. Sabemos que, ao entrar na universidade, temos que passar mais tempo fora de casa, mas o apoio emocional da instituição nem sempre está disponível. Alguns professores entenderam essa situação, mas não foi o caso de todos. Tive a sorte de encontrar uma professora que foi muito especial para mim. Ela demonstrou empatia e me acolheu desde o início”, diz.
Vanusa Guajajara, estudante de biologia, produz artesanato com os traços culturais de seu povo, na TI Rio Pindaré Foto: Genilson Guajajara/InfoAmazonia
As dificuldades de deslocamento, somadas à falta de apoio emocional na universidade e à necessidade de cuidar dos filhos, agravaram a situação. Vanusa enfrentou crises de pânico e ansiedade, o que a levou a faltar às aulas e a sentir pressão tanto na universidade quanto na comunidade.
Embora Zé Doca esteja a cerca de 40 minutos da aldeia onde Vanusa mora, a viagem às vezes podia levar até 2 horas, dependendo das condições da estrada. Os custos diários com transporte totalizam pelo menos R$ 70. Além disso, a BR-316, que dá acesso ao município e corta a TI Rio Pindaré, é frequentemente bloqueada e palco de manifestações.
“Eu estudo e me formo, mas minha base é o território. Minha base é meu tio, que lutou pelo território. Minha mãe, que é artesã. Minha tia, que é uma anciã que realiza rituais. Eles são minha fonte de conhecimento e formação como ser social. O conhecimento externo é importante, mas precisamos estar nos espaços do ensino superior e das universidades para contestar narrativas históricas e artigos que romantizam certas situações. É essencial desmentir essas distorções e compartilhar o conhecimento tradicional que possuímos”, afirma.
Com tudo isso, Vanusa optou por um novo processo seletivo para a Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Ela ingressará em uma turma com aulas aos fins de semana. Ela gostaria de, futuramente, realizar as aulas dentro do território indígena. "Eu optei por ir para a UFMA mesmo. Foi uma questão de não ter outra escolha, porque eu ia continuar nessa situação sufocante, e a pressão psicológica era muito grande.”
Djelma Guajajara migrou da sua comunidade para estudar na cidade e enfrentou o desconhecimento sobre a cultura indígena Foto: Genilson Guajajara/InfoAmazonia
Djelma Viana Guajajara, de 22 anos, é estudante de administração na UEMA, no campus do município maranhense de Bacabal. Ela também é da aldeia Piçarra Preta, mas, ao contrário de Vanusa, optou por se mudar para a cidade para fazer a faculdade.
“Iniciei a universidade com 17 anos, logo após concluir o ensino médio (...). Quando morávamos na Terra Indígena Caru, o acesso à educação era limitado. Saímos de lá em 2009, quando eu tinha 8 anos, e o ensino ainda é precário. Na aldeia Maçaranduba [da Terra Indígena Caru], o ensino é normal, com alguns professores indígenas, mas muitos são de povoados próximos e não têm formação superior”, explica.
No início da graduação, ela conta que a diferença entre a educação da terra indígena e a da cidade ficou evidente, especialmente com o uso de termos técnicos pelos professores. “Não conhecia ninguém e não tinha transporte, então foi complicado. Depois, quando me aproximei mais das pessoas, algumas me ajudaram com transporte. A rotina era intensa, com aulas e atividades todos os dias, e eu não tinha um notebook. Então, era bem difícil”.
Ela diz que recebeu apoio de outros indígenas de sua aldeia que estudavam em Bacabal, inclusive para dividir o aluguel e pegar um computador emprestado. Nos primeiros períodos da faculdade, Djelma e outro “parente” eram os únicos indígenas na turma de administração.
Djelma Guajajara entrando na Universidade Estadual do Maranhão, onde estuda administração Foto: Genilson Guajajara/InfoAmazonia
Apesar de ter feito mais amigos, segundo a estudante, a inclusão de temas relacionados à cultura indígena na universidade é limitada. Ela participou de apenas um seminário sobre meio ambiente em 2022, o único evento que abordou a perspectiva indígena. Além disso, uma turma de Engenharia Civil visitou uma comunidade uma única vez.
Djelma afirma que a experiência universitária mudou sua visão sobre a carreira. Ela conta que aspirava ser uma executiva de uma grande empresa “trabalhando para os brancos”, mas que agora deseja “continuar contribuindo com as lideranças e com o território”. "É isso que as lideranças e os anciãos esperam de nós, enquanto jovens e futura geração”, afirma.