Climate Week | Pará firma acordo para venda de R$ 1 bi em créditos de carbono; medida pode acelerar regulação no Congresso

24/09/2024 19:26

O Estado do Pará e a iniciativa LEAF Coalition oficializaram nesta terça-feira (24) o anúncio de um acordo de venda de crédito de carbono de áreas do Estado avaliado em US$ 180 milhões, equivalente a quase 1 bilhão de reais. A comercialização dos créditos será feita com empresas como a Amazon e Wallmart e governos como Estados Unidos e Reino Unido. A iniciativa foi mencionada antecipadamente pelo governador do Pará, Helder Barbalho, ainda na segunda-feira (23), durante sua participação no evento Casa Amazônia, organizado pela Rede Amazônidas pelo Clima (RAC), em Nova York, na Semana do Clima.

"Serão 12 milhões de toneladas, comercializadas a 15 dólares cada tonelada. Isso em uma única operação de carbono jurisdicional, a maior comercialização do mundo. Isso como destaque, recursos que estarão vinculados à uma estratégia de distribuição, em que os recursos estarão indo para a sociedade, povos indígenas, quilombolas, extrativistas, agricultura familiar. A parte que couber ao Estado sendo o Estado obrigado que use vinculado à continuidade à política de redução de emissões", disse Helder, durante o evento na Casa Amazônia.

O governador também afirmou que está em estudo a estimativa de oferta de crédito de 390 milhões de toneladas até 2027. "Neste acordo são aquelas já certificadas e aptas para a comercialização", disse.

Acordo deve pressionar Congresso por regulamentação do mercado de carbono

Ao centro, Ana Toni, secretária de Mudança do Clima com André Corrêa do Lago (esquerda), Secretário para Clima e Meio Ambiente,
do Ministério de Relações Exteriores e Johan Rockström,  diretor do Institute for
Climate Impact Research, durante evento promovido pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS) e Instituto Arapyaú, na Climate Week. 

Ainda que o acordo firmado pelo Governo do Pará não dependa da regulação para ser efetivado, o anúncio coloca mais um pouco de pressão no Congresso Nacional para o debate e aprovação da lei que debate a regulamentação do mercado de carbono no Brasil. Para Ana Toni, secretária de Mudança do Clima, do Ministério do Meio Ambiente, o país está atrasado na definição das regras desse mercado. 

“Tomara que acelere o nosso Congresso, para que finalmente a gente possa ter uma lei de mercado de carbono brasileira. Isso vai nos qualificar cada vez mais para dialogar globalmente sobre esse mercado. Agora é com os congressistas, com o Senado. Eles têm agora que correr com isso, porque a gente já tá atrasado uns 10 anos nessa lei de mercado carbono. Essa lei está muito atrasada e cada dia que passa a gente se desqualifica para o debate global que a gente tanto precisa", disse.

Após ter sido aprovado apenas em dezembro de 2023 na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei (PL) 2.148/2015, que cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), aguarda aprovação pelo Senado Federal. O texto deve definir tetos para emissões e prevê regras para a venda de títulos de compensação. 

Consultora alerta para desafio de evitar duplicação de créditos

Para Isabela Morbach, consultora para mercado de carbono do Campos Mello Advogados, avalia que o acordo firmado pelo Pará tem evidências de ser robusto, considerando a metodologia aplicada. E terá agora o desafio de mostrar, ao longo dos anos, que está reduzindo desmatamento. Outro ponto de atenção sobre o tema e que se replica em iniciativas semelhantes por entes públicos é que seja evitada a duplicação de créditos no mercado voluntário das mesmas áreas. 

"Um dos maiores desafios será o que chamamos de aninhamento entre os projetos privados de crédito de carbono e os projetos do Estado, para não ter dupla contabilidade das mesmas áreas. Esse é um desafio importante, já mapeado e que precisa ser endereçado e resolvido. Mas, o fato é que o crédito jurisdicional é um bom incentivo para que os Estados  implementem políticas públicas efetivas de fiscalização e combate ao desmatamento, não só pro Pará, mas outros Estados que estão buscando entrar nesse mercado de crédito de carbono jurisdicional", afirma

Governo prevê uso de recursos da venda de créditos de carbono já em 2025

O governador Helder também reforçou que a expectativa é que os recursos possam ser utilizados já no próximo ano, mas precisará ainda encaminhar à Assembleia Legislativa do Estado um projeto de lei sobre como os recursos serão distribuídos e aplicados. 

“Estamos discutindo o modelo de repartição. Temos nos próximos meses que avançar num acordo com todas as partes para encaminhar à Assembleia Legislativa um projeto de lei de cota parte de cada segmento que terá direito a esta utilização”, detalhou. 

Para a gestão dos recursos, o governo aposta também num modelo de governança profissional. “O mecanismo de governança da transação e aplicação dos recursos deverá ser através da Companhia de Ativos Ambientais do Estado, meio de governança que deverá fazer a gestão dos recursos. Inclusive estamos procurando no mercado uma gestão profissional, para que a companhia tenha alguém ou time que possa ter capacidade de interlocução”, afirmou. 

Os créditos para essa venda foram mapeados a partir de detalhamento por um sistema exclusivo do Estado. “Quando apostamos no sistema jurisdicional, verificamos quanto o território paraense detinha de desmatamento ano a ano, estabelecemos uma meta e então vamos comparar a redução diante da meta e fazemos a projeção. Aí temos que entregar ano a ano”, explicou.

Entenda mais - O contrato assinado nesta terça-feira (25) é denominado Contrato de Compra e Venda de Reduções Certificadas de Emissão (ERPA, na sigla em inglês), um contrato de compra e venda futura de emissões reduzidas (conhecidos popularmente como créditos de carbono jurisdicionais). 

De acordo com comunicado da LEAF, esta captação de recursos se dá no âmbito do mercado voluntário. Os recursos serão utilizados, a partir de 2025, para financiar programas que visam reduzir ainda mais o desmatamento, além de apoiar o modo de vida dos povos tradicionais e o desenvolvimento sustentável. Esses programas compartilharão equitativamente os benefícios econômicos com os povos indígenas, quilombolas, comunidades extrativistas e agricultores familiares que estão na linha de frente na luta contra o desmatamento.

A Coalizão LEAF é uma iniciativa pública e privada internacional que inclui diversas grandes corporações e os governos da Noruega, Reino Unido, Estados Unidos e República da Coreia, e visa fornecer financiamento para apoiar os governos florestais e as comunidades locais em seus esforços para reduzir o desmatamento e a degradação florestal.

Os compradores da Coalizão LEAF, incluindo Amazon, Bayer, BCG, Capgemini, H&M Group e Fundação Walmart, se comprometeram a comprar 5 milhões de créditos de reduções de emissões. O acordo também disponibilizará mais 7 milhões de créditos para compradores corporativos adicionais.

A Política Estadual sobre Mudanças Climáticas do Pará estabeleceu o rumo para a transição do Pará para uma economia de baixo carbono, com a meta de emissões líquidas zero até 2036. Em 2024, o Pará registrou uma redução de 42% nos alertas de desmatamento em comparação com o ano anterior, segundo dados oficiais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

O financiamento do acordo LEAF também apoiará outros esforços liderados pelo governo para reduzir as emissões do desmatamento, incluindo o Plano Estadual Amazônia Agora (PEAA) do Pará, que inclui iniciativas como o Plano Estadual de Bioeconomia, o Plano de Recuperação da Vegetação Nativa e o Programa de Pagamento por Serviços Ambientais. 

Todos os créditos vendidos no escopo do acordo com o Pará atenderão ao Padrão de Excelência Ambiental Architecture for REDD+ Transactions (ART TREES), que visa garantir integridade ambiental e salvaguardas sociais.

Os créditos REDD+ jurisdicionais representam reduções  de emissões provenientes de programas em larga escala em nível nacional ou subnacional. O acordo assinado esta semana sucede os primeiros contratos LEAF com Costa Rica e Gana, anunciados na COP28 em dezembro de 2023. A Emergent, empresa que mediou o acordo, afirma que continuará a trabalhar na assinatura de acordos com governos florestais, incluindo Vietnã, o estado brasileiro do Acre, Nepal e Equador.

 

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